terça-feira, 22 de dezembro de 2009

mais de uma amor pra voces...

AFINIDADE

A afinidade não é o mais brilhante, mas o mais sutil, delicado e penetrante dos sentimentos. O mais independente.
Não importa o tempo, a ausência, os adiamentos,as distâncias, as impossibilidades; Quando há afinidade, qualquer reencontro retoma a relação,o diálogo, a conversa, o afeto, no exato ponto em que foi interrompido.
Afinidade é não haver tempo mediando a vida. É uma vitória do adivinhado sobre o real. Do subjetivo sobre o objetivo. Do permanente sobre o passageiro. Do básico sobre o superficial. Ter afinidade é muito raro, mas quando existe não precisa de códigos verbais para se manifestar. Existia antes do conhecimento, irradia durante e permanece depois que as pessoas deixaram de estar juntas.
O que você tem dificuldade de expressar a um não afim, sai simplese claro diante de alguém com quem você tem afinidade. Afinidade é ficar longe pensando parecido a respeito dos mesmos fatos que impressionam, comovem ou mobilizam; É ficar conversando sem trocar palavra. É receber o que vem do outro com aceitação anterior ao entendimento.
Afinidade é sentir com. Nem sentir contra, nem sentir para, nem sentir por, nem sentir pelo.
Quanta gente ama loucamente, mas sente contra o ser amado. Quantos amam e sentem para o ser amado, não para eles próprios. Sentir com é não ter necessidade de explicar o que está sentindo.É olhar e perceber.É mais calar do que falar. Ou quando é falar, jamais explicar, apenas afirmar.
Afinidade é jamais sentir por. Quem sente por, confunde afinidade com masoquismo, mas quem sente com, avalia sem se contaminar, compreende sem ocupar o lugar do outro. Aceita para poder questionar. Quem não tem afinidade, questiona por não aceitar. Só entra em relação rica e saudável com o outro, quem aceita para poder questionar.
Não sei se sou claro: quem aceita para poder questionar, não nega ao outro a possibilidade de ser o que é, como é, da maneira que é.E, aceitando-o, aí sim, pode questionar, até duramente, se for o caso. Isso é afinidade. Mas o habitual é vermos alguém questionar porque não aceitao outro como ele é. Por isso, aliás, questiona.Questionamento de afins, eis a (in)fluência. Questionamento de não afins, eis a guerra.
A afinidade não precisa do amor. Pode existir com ou sem ele. Independente dele, a quilômetros de distância, na maneira de falar, de escrever, de andar, de respirar.
Há afinidade por pessoas a quem apenas vemos passar, por vizinhos com quem nunca falamos e de quem nada sabemos.Há afinidade com pessoas de outros continentes a quem nunca vemos,veremos ou falaremos. Quem pode afirmar que, durante o sono, fluidos nossos não saem para buscar sintomas com pessoas distantes, com amigos a quem não vemos, com amores latentes, com irmãos do não vivido?
A afinidade é singular, discreta e independente porque não precisa do tempo para existir. Vinte anos sem ver aquela pessoa com quem se estabeleceu o vínculo da afinidade! No dia em que a vir de novo, você vai prosseguir a relação exatamente do ponto em que parou. Afinidade é a adivinhação de essências não conhecidas nem pelas pessoas que as tem. Por prescindir do tempo e ser a ele superior, a afinidade vence a morte, porque cada um de nós traz afinidades ancestrais com a experiência da espécie no inconsciente. Ela se prolonga nas células dos que nascem de nós, para encontrar sintonias futuras nas quais estaremos presentes.
Sensível é a afinidade. É exigente, apenas de que as pessoas evoluam parecido. Que a erosão, amadurecimento ou aperfeiçoamento sejam do mesmo grau, porque o que define a afinidade é a sua existência também depois. Aquele ou aquela de quem você foi tão amigo ou amado, e anos depois encontra com saudade ou alegria, mas percebe que não vai conseguir restituir o clima afetivo de antes, é alguém com quem a afinidade foi temporária. E afinidade real não é temporária. É supratemporal. Nada mais doloroso que contemplar afinidade morta,ou a ilusão de que as vivências daquela época eram afinidade. A pessoa mudou, transformou-se por outros meios. A vida passou por ela e fez tempestades, chuvas,plantios de resultado diverso.
Afinidade é ter perdas semelhantes e iguais esperanças,é conversar no silêncio, tanto das possibilidades exercidas,quantos das impossibilidades vividas. Afinidade é retomar a relação do ponto em que parou, sem lamentar o tempo da separação. Porque tempo e separação nunca existiram. Foram apenas a oportunidade dada (tirada) pela vida para que a maturação comum pudesse se dar. E para que cada pessoa pudesse e possa ser, cada vez mais, a expressão do outro sob a forma ampliada e refletida do eu individual aprimorado.
objetivo. Do permanente sobre o passageiro. Do básico sobre o superficial.

Arthur da Távola

Um comentário:

  1. NOSSA QUE LINDO E PROFUNDO...SIMONE VC E TUDO DE BOM...E MUITO BOM ACOMPANHAR VC...BEIJOS

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